Ao me propor a debater o papel do empresário na formulação de nossa política econômica, gostaria de, inicialmente, reafirmar uma posição que venho defendendo há algum tempo: os empresários devem participar mais ativamente no processo de elaboração da política econômica brasileira, e não apenas serem os agentes passivos de sua execução. Mas, esta participação exige, como primeiro passo, um diálogo mais estreito entre governo e empresários.
Para que isso aconteça, torna-se imprescindível a disposição do governo em aceitar a nossa participação, e esta atitude será grandemente facilitada na medida em que o setor privado mostrar capacidade de mobilização na defesa de seus legítimos interesses.
De nossa parte, ainda, precisamos nos habilitar para o dialogo com as autoridades governamentais, não apenas em termos de reivindicações, pleitos ou críticas, mas, sobretudo, procurando entender que os problemas econômicos da nação são também os problemas de cada empresário em particular.
Acredito também que o empresariado nacional já está suficientemente maduro para exercer a sua verdadeira vocação: inovar e assumir riscos, inerentes a sua atividade econômica, com um mínimo de interferência governamental. Por exemplo, o quadro atual de dificuldades econômicas do País oferece ao empresariado excelentes possibilidades de encontrar, nos seus próprios setores, soluções criativas que respondam aos desafios econômicos. Esta é, a meu ver, uma das maneiras mais eficazes de contribuir para que se promova a descentralização da política econômica, objetivo este que deve ser perseguido pela iniciativa privada.
Quero, nesta altura, convidar os presentes a uma reflexão conjunta sobre estes desafios, pois lhes influenciam fortemente o desempenho da economia nacional.
Sem nenhuma pretensão de originalidade, mas apenas para ser um exercício feito entre nós, empresários, gostaria de relacionar alguns problemas que persistem desafiando a nossa capacidade de solucioná-los. O principal deles, o desequilíbrio do balanço de pagamentos é resultante de duas causas fundamentais, os déficits da balança comercial provocados pela nossa dependência energética e o déficit da balança de serviços causados pelos encargos com juros da divida externa. Como segundo problema, observamos a continuação do processo inflacionário, que se mantém em altos níveis e, provavelmente, é resultante de três fatores distintos: a inflação importada, os déficits do setor público e o desempenho insatisfatório da agricultura. A inflação importada está relacionada com a elevação dos preços do petróleo. Os déficits do setor público devem ser entendidos no seu sentido mais amplo, compreendendo não só os desequilíbrios financeiros do tesouro federal, mas também os gastos excessivos das empresas controladas pelo Governo. Gostaria de salientar, ainda, que esses desequilíbrios não decorrem apenas de investimentos nem sempre prioritários e muitas vezes superdimensionados, mas são também determinados pelos dispêndios de custeio da maquina administrativa governamental. Finalmente, é do conhecimento de todos que o desempenho do setor agrícola até 1979 foi seriamente afetado pelas sucessivas quebras de safras. Afora os problemas conjunturais aqui mencionados, não se deve em nenhum momento minimizar a nossa quase absoluta dependência energética. Esta é seguramente uma posição de extrema vulnerabilidade que exige uma firme determinação de toda a coletividade, de todos os brasileiros no sentido de não mais adiarmos a implantação dos programas já apontados como eficazes para, pelo menos, diminuirmos essa dependência o mais rápido possível.
Embora graves e inegavelmente de difícil equacionamento, é importante não esquecermos que estes problemas atingem também outras economias com maior ou menos intensidade, sejam elas capitalistas ou socialistas, economias desenvolvidas ou em desenvolvimento. Portanto, cabe lembrar que problemas crônicos como inflação e balança de pagamentos não são privilégios apenas dos brasileiros.
Reconhecer a existência de dificuldades e compreender as suas conseqüências é dever de todo empresário. Além disso, este reconhecimento constitui uma etapa importante para a definição das alternativas que nos permitirão superar os obstáculos já apontados. Ao indicar tais alternativas, não pretendo oferecer soluções novas, pois elas já constam das políticas governamentais. No entanto, cabe a mim como empresário, representando um segmento importante do setor privado, encarecer a viabilidade dos caminhos sugeridos e lutar sem esmorecimento para a sua implementação.
A idéia básica que quero hoje transmitir aos senhores é muito simples. O Brasil enfrenta dificuldades, sem dúvida, mas este fato não nos deve deixar perder de vista um ponto fundamental: o Brasil é um país com imensas potencialidades e já atingiu maturidade política e econômica para ser capaz de resolver seus problemas por conta própria.
No momento atual existem duas políticas econômicas alternativas para combatermos a inflação e reequilibrarmos a balança de pagamentos: uma é a política ortodoxa, clássica, muito a gosto dos técnicos, de instituições financeiras internacionais, como por exemplo, o Fundo Monetário Internacional, que implica em caminharmos em direção a uma recessão generalizada; a outra é a de mantermos a taxa de crescimento da economia a um nível compatível com as nossas necessidades e possibilidades, fazendo, ao mesmo tempo, um redirecionamento dos investimentos no sentido de importar o mínimo possível e exportar o máximo.
A primeira é a solução tradicional, que acredita que a inflação é fundamentalmente causada por excesso de demanda; que as importações só podem ser reduzidas levando as empresas à falência ou pelo menos a grandes dificuldades; que os investimentos, e de um modo geral, a produção, não podem ser redirecionados, mas simplesmente reduzidos.
Não acredito nessa solução. O Brasil não é suficientemente rico e desenvolvido, para poder adotá-la. Esta solução teria trágicas conseqüências para o País: prejuízo e desemprego indiscriminados, porque atingiriam todos os setores da economia, e não apenas alguns setores, que efetivamente podem ser desacelerados.
Acredito que a única alternativa legitima para o Brasil é continuarmos a crescer, ainda que moderadamente. O ideal seria crescermos a 8% ou 9% ao ano, mas dadas as dificuldades com o balanço de pagamentos provavelmente teremos que nos contentar com algo ao redor de 5%. O que não podemos é reduzir essa taxa para cerca de 3%. Nesse momento, estaríamos em verdadeira recessão, pois com um crescimento da produção de apenas 3% ou 4%, a oferta de novos empregos seria absolutamente insuficientemente para atender a procura por parte dos trabalhadores.
Precisamos crescer a mais de 5%, mas precisamos ao mesmo tempo reduzir nossas importações. Isto é possível desde que aumentemos a produção de produtos exportáveis e de produtos de consumo interno que tenham um baixo coeficiente de importação, ao mesmo tempo em que desaceleremos os setores com alto coeficiente de importações.
É preciso dar continuidade a política de fortalecimento da agricultura; acelerar os investimentos em energia; estimular a produção de bens de consumo de massa; e não se esquecer de incentivar setores de grande alcance social, como por exemplo, o de habilitação popular.
Para combater a inflação precisamos aumentar a produção e não reduzi-la. Precisamos aproveitar a capacidade ociosa existente em muitos setores. Com o aumento de produção, poderemos reduzir os preços.
Precisamos também dar condições e ao mesmo tempo exigir que o governo reequilibre seu orçamento. Para isto é necessário reduzir as despesas de custeio, reduzir os subsídios, e aumentar a receita em setores determinados.
Em síntese, precisamos produzir mais, exportar mais, e mudar a estrutura de consumo, consumindo menos bens de luxo, que são também os bens com mais alto componente importado.
Estou convencido de que somos capazes de realizar essa política. E não precisamos, em absoluto, da tutela de ninguém. Quando os banqueiros internacionais nos emprestaram US$ 50 bilhões, estavam demonstrando que acreditavam no Brasil e, ao mesmo tempo, que estavam fazendo um bom negócio. Não há razão alguma para que mudem de opinião. O Brasil já é um grande país no cenário internacional. Acredito que sabemos muito bem conduzir nossa própria política econômica. E se houver um engajamento de toda a sociedade brasileira e em particular, dos empresários, dentro de uma política econômica efetivamente descentralizada, vamos superar as dificuldades, certamente com sacrifícios, mas num prazo mais curto do que se possa imaginar.