POR Abilio Diniz

Recessão não é solução para o problema de balanço de pagamentos do Brasil. Esta foi, no meu entender, a mais importante conclusão a que chegaram economistas, empresários e jornalistas de diversas tendências após dois dias de intenso debate no recente seminário promovido pelo Jornal da Tarde. Uma conclusão que, sem dúvida, vem confirmar as preocupações que tenho manifestado, já há algum tempo, com respeito à dosagem excessiva com que a política de ajustamento tem sido aplicada no Brasil. Tanto o Prof. Fishow quanto o Prof. Simonsen concordaram que a recessão pode auxiliar em uma situação conjuntural e de curto prazo. E ambos reconheceram que a opção por esta política recessiva foi tomada em face de uma ameaça concreta de ruptura de caixa no final do ano passado, quando representava, talvez, o único caminho a seguir. Mas é preciso termos sempre em vista que recessão tem que ser um remédio transitório, caso contrário contribuirá para prejudicar ainda mais o País, pois é sabido que os banqueiros relutam emprestar para quem não cresce.

De fato, a recessão tem efeitos modestos sobre o comportamento da balança comercial. Com relação às exportações, já está provado, que raramente se deixou de exportar por falta de excedente, mas sim por falta de experiência e tradição no mercado internacional. Quanto às importações, apesar da produção industrial brasileira ter sofrido no primeiro semestre deste ano uma redução de 3,3% em relação ao mesmo período do ano passado (em São Paulo a queda foi de 5,62%), as importações totais caíram apenas 0,9%, o que representa uma redução ínfima em termos absolutos de US$ 95 milhões. Excluindo o trigo e o petróleo, as demais importações sofreram neste período uma redução de apenas US$ 393 milhões. Resultado bastante modesto quando comparado à estimativa de que, este ano, vamos deixar de produzir, como reflexo da política econômica recessiva, cerca de US$ 10 bilhões. Como conseqüência, o nível de desemprego está atingindo níveis preocupantes em todo País.

Mas a razão mais importante para a adoção desta política recessiva, além do problema de liquidez imediata para fechar as contas externas, foi apontada pelo Prof. Fishlow. Segundo ele, o que determinou o aumento de credibilidade externa do País, muito mais do que os resultados, foi a adoção por parte do governo brasileiro de medidas de política econômica ortodoxas. O que nos leva a concluir que uma mudança na orientação da política econômica, mesmo sem grande reflexo no balanço comercial e na inflação, pode comprometer a confiança readquirida junto ao sistema financeiro internacional. Este é o quadro que tem me levado insistentemente a afirmar que a orientação da política econômica deve ser mantida, ainda por algum tempo, mas que a sua dosagem tem que ser modificada.

Outro fato importante precisa ser lembrado: o problema da divida brasileira e do balanço de pagamentos só poderá ser equacionado em longo prazo através de um significativo superávit comercial num primeiro momento e, em seguida, um superávit nas transações correntes. Nesse sentido, vale lembrar que num passado recente, entre 1974 -78, nossas importações ficaram sob controle e cresceram apenas a 2% ao ano, enquanto as exportações cresceram a taxas superiores a 12%, e o PIB a uma taxa media anual acima de 7%. Isto me leva a concluir que uma política de controle seletivo de importações, permitirá que estas cresçam a taxas modestas, digamos de 5% a.a. Em minha opinião, isto é perfeitamente viável, pois, hoje, é mais remota a perspectiva de que venhamos a sofrer novos “choques de petróleo” como os que ocorreram em 1973 e 1979. Com as importações crescendo a essa taxa, a economia brasileira poderá voltar a crescer, moderadamente segundo o nosso padrão, porém, numa média bem elevada segundo os padrões internacionais.

Para se alcançar estes resultados seriam necessários uma programação muito mais abrangente de médio e longo prazo que visasse substituir ao máximo as importações, concomitantemente com um programa de aumento de exportações, com o redirecionamento do crescimento da economia brasileira, ajustando-a a nova realidade criada do petróleo. Toda ênfase deve ser dada aos elementos sobre os quais temos controle, isto é, as importações e a expansão do mercado interno. O aumento de exportações é crucial neste programa, mas devemos abandonar a idéia de exportar a qualquer preço. Pois, não podemos basear toda nossa política de reequilíbrio do balanço de pagamentos numa variável sobre a qual não temos completo controle.

Esta falta de definições mais detalhadas das prioridades e de uma programação de longo prazo foi, novamente, apontada pelo Prof. Fishlow. Ultimamente, as nossas decisões na área econômica têm caráter muito imediatista. É claro que muitas vezes os problemas imediatos são tão graves e abrangentes que obrigam tomadas de decisões sem considerar as implicações futuras. Porém, o desequilibro do nosso balanço de pagamentos apresenta um caráter crônico e estrutural e, por causa disso, tem que ser equacionado por medidas de longo prazo.

Um planejamento detalhado, e que demonstre a sua viabilidade, ajudaria a consolidar a nossa credibilidade junto à comunidade financeira internacional. Internamente, a divulgação e o debate de um programa desta natureza, definindo claramente as metas e os instrumentos para atingi-los, restabeleceria a confiança da nação e ajudaria diminuir as apreensões e ansiedades experimentadas nos diversos segmentos sociais.